13/09/2013

O Cinema na Agricultura

Miguel Mota
          As recentes notícias sobre os problemas orçamentais da cinemateca fizeram-me recordar a Comunicação apresentada ao “II Simpósio Nacional sobre a Articulação entre a Investigação e a Extensão na Agricultura”, em Évora, em 23 de Janeiro de 1998, intitulada “O cinema como instrumento de divulgação agrícola”. Dessa Comunicação apresento alguns excertos.

Se a palavra escrita, através dos livros ou das revistas de divulgação agrícola, é uma das bases principais da transposição para o agricultor dos conhecimentos criados pela investigação, o cinema é um complemento indispensável desse trabalho.

A imagem em  movimento é uma excelente forma de demonstrar práticas agrícolas que só poderiam ser vistas, no campo ou no laboratório, por números restritos de pessoas. Permite repetir qualquer cena quantas vezes se desejar e apresentar em poucos minutos uma série de acções que, na realidade, estariam separadas no tempo e exigindo mais do que uma visita como, por exemplo, trabalhos realizados desde a sementeira à colheita. Permite ver, com aceleração ou ao retardador, fenómenos que, à sua velocidade normal, seriam de difícil observação, por serem demasiado lentos ou demasiado rápidos, como a eclosão duma lagarta ou o lançamento espontâneo de sementes ou esporos. Finalmente, permite-nos ainda ver, com utilização da lupa ou do microscópio, fenómenos impossíveis de observar a olho nu.

O Ministério da Agricultura foi o segundo, em Portugal (o primeiro foi o Ministério do Exército), a criar os seus Serviços Cinematográficos. Marcaram época os filmes realizados pelo primeiro encarregado desses serviços, o senhor Adolfo Coelho, que se notabilizou como realizador.

O Ministério da Agricultura produziu, a partir de então, uma quantidade muito grande de filmes agrícolas variados, de grande valor didático, muitos deles com assinalável qualidade artística.

Em 1991, a Ordem dos Engenheiros  - onde eu exercia então o cargo de Coordenador da Comissão de Especialidade de Engenharia Agronómica - promoveu, em colaboração com o Ministério da Agricultura e a Cinemateca Portuguesa, uma “Mostra Retrospectiva do Filme Agrícola Português”, com sessões durante três tardes seguidas. Nessa mostra se apresentaram alguns dos melhores filmes existentes, entre os quais um que ficou famoso, “Flores - mundo de beleza”, dirigido pelo notável investigador que foi o Prof. Eng.º Agrónomo e Silvicultor Joaquim Vieira Natividade e pelo Eng.º Agrónomo António Félix da Cruz.

Os filmes apresentados nessa “Mostra” foram os seguintes:

No primeiro dia (3 de Julho de 1991), “Os toiros na faina agrícola ribatejana” (1939), “A vida do linho” (1942), “Aprenda a comer” (1945) e “O combate à praga dos gafanhotos” (1946), todos de Adolfo Coelho.

No segundo dia (4 de Julho de 1991), “Flores - Mundo de beleza” (1957), de Joaquim Vieira Natividade e António Félix da Cruz, “A floresta portuguesa” (1967), “Milho híbrido” (1971) e “Laranjas de Portugal” (1971), todos de António Félix da Cruz.

No terceiro dia (5 de Julho de 1991), “O sobreiro” (1959), de João Mendes, “Cooperativas agrícolas” (1970), “Horticultura moderna” (1972/73) e “Reconversão da vinha no Noroeste Português” (1972/73), todos de Alice Gamito.

Gostaria de ter apresentado um dos melhores, ainda de Adolfo Coelho, sobre a lagarta do sobreiro, a Lymantria dispar, mas tal não foi possível. Quando quis fazer a “Mostra Retrospectiva do Filme Agrícola Português” era ainda Luís de Pina o Director da Cinemateca e bem se lembrava desse filme sobre a lagarta do sobreiro. Mas não existia na Cinemateca uma única cópia do filme. No Ministério, contaram-me que tinha havido em tempos um incêndio e também já lá não havia qualquer cópia desse filme, pelo que não pôde ser apresentado. É só mais um caso de delapidação do património cultural português.

Luís de Pina entretanto faleceu e à data da realização da “Mostra” já era Director da Cinemateca o antigo Subdirector, o Dr. João Bénard da Costa.