Miguel Mota |
Se a palavra escrita, através dos livros ou
das revistas de divulgação agrícola, é uma das bases principais da transposição
para o agricultor dos conhecimentos criados pela investigação, o cinema é um
complemento indispensável desse trabalho.
A imagem em
movimento é uma excelente forma de demonstrar práticas agrícolas que só
poderiam ser vistas, no campo ou no laboratório, por números restritos de
pessoas. Permite repetir qualquer cena quantas vezes se desejar e apresentar em
poucos minutos uma série de acções que, na realidade, estariam separadas no
tempo e exigindo mais do que uma visita como, por exemplo, trabalhos realizados
desde a sementeira à colheita. Permite ver, com aceleração ou ao retardador,
fenómenos que, à sua velocidade normal, seriam de difícil observação, por serem
demasiado lentos ou demasiado rápidos, como a eclosão duma lagarta ou o
lançamento espontâneo de sementes ou esporos. Finalmente, permite-nos ainda
ver, com utilização da lupa ou do microscópio, fenómenos impossíveis de
observar a olho nu.
O Ministério da Agricultura foi o segundo, em
Portugal (o primeiro foi o Ministério do Exército), a criar os seus Serviços
Cinematográficos. Marcaram época os filmes realizados pelo primeiro encarregado
desses serviços, o senhor Adolfo Coelho, que se notabilizou como realizador.
O Ministério da Agricultura produziu, a
partir de então, uma quantidade muito grande de filmes agrícolas variados, de
grande valor didático, muitos deles com assinalável qualidade artística.
Em 1991, a Ordem dos Engenheiros - onde eu exercia então o cargo de
Coordenador da Comissão de Especialidade de Engenharia Agronómica - promoveu,
em colaboração com o Ministério da Agricultura e a Cinemateca Portuguesa, uma
“Mostra Retrospectiva do Filme Agrícola Português”, com sessões durante três
tardes seguidas. Nessa mostra se apresentaram alguns dos melhores filmes
existentes, entre os quais um que ficou famoso, “Flores - mundo de beleza”,
dirigido pelo notável investigador que foi o Prof. Eng.º Agrónomo e Silvicultor
Joaquim Vieira Natividade e pelo Eng.º Agrónomo António Félix da Cruz.
Os filmes apresentados nessa “Mostra” foram
os seguintes:
No primeiro dia (3 de Julho de 1991), “Os
toiros na faina agrícola ribatejana” (1939), “A vida do linho” (1942), “Aprenda
a comer” (1945) e “O combate à praga dos gafanhotos” (1946), todos de Adolfo
Coelho.
No segundo dia (4 de Julho de 1991),
“Flores - Mundo de beleza” (1957), de Joaquim Vieira Natividade e António Félix
da Cruz, “A floresta portuguesa” (1967), “Milho híbrido” (1971) e “Laranjas de
Portugal” (1971), todos de António Félix da Cruz.
No terceiro dia (5 de Julho de 1991), “O
sobreiro” (1959), de João Mendes, “Cooperativas agrícolas” (1970),
“Horticultura moderna” (1972/73) e “Reconversão da vinha no Noroeste Português”
(1972/73), todos de Alice Gamito.
Gostaria de ter apresentado um dos
melhores, ainda de Adolfo Coelho, sobre a lagarta do sobreiro, a Lymantria dispar, mas tal não foi
possível. Quando quis fazer a “Mostra
Retrospectiva do Filme Agrícola Português” era ainda Luís de Pina o Director da
Cinemateca e bem se lembrava desse filme sobre a lagarta do sobreiro. Mas não
existia na Cinemateca uma única cópia do filme. No Ministério, contaram-me que
tinha havido em tempos um incêndio e também já lá não havia qualquer cópia
desse filme, pelo que não pôde ser apresentado. É só mais um caso de
delapidação do património cultural português.