23/06/2013

A alternativa a este tipo de mundo

Mário de Oliveira
“Neste tipo de mundo, tereis aflições. Mas coragem, Eu Sou a alternativa a este tipo de mundo” (cf João 16,33). Oportunas e ousadas palavras, estas de Jesus. Por isso, depois de dois mil anos de cristianismo, que o mesmo é dizer, dois mil anos de propositado silenciamento, propositada negação de Jesus, o de Nazaré e da sua via política maiêutica, o tipo de mundo que dele resulta e está aí, só pode ser um mundo em vias de extinção. Não é uma má notícia que lhes dou. É uma boa notícia, ainda que possa trazer junto com ela, muitas dores, muita destruição, porventura, um planetário dilúvio nuclear, ou mesmo de água. Cada vez mais inevitável, depois de tanto crime institucionalizado e de tanto pensamento filosófico, teológico, económico e artístico, nascido de todas as práticas intrinsecamente demenciais, perversas, exploradoras, genocidas e ecocidas, típicas do cristianismo. As dores e a destruição não são parte da boa notícia. Apenas o resultado das práticas cristãs, mentirosamente apresentadas como boas e santas, quando são práticas intrinsecamente perversas, mascaradas de boas e santas. Boas e santas, só mesmo as práticas de Jesus de Nazaré, que nunca foi cristão nem nunca tolerou que o convertessem, como faz o cristianismo, no mítico messias/cristo davídico, a traição das traições.

 Não esperemos que as igrejas cristãs, alguma vez, no-lo digam e nos alertem para esta real situação histórica, à beira de implodir. Elas são parte do problema, não da solução. São o problema, não a solução. Porque as igrejas cristãs, onde estiverem, são Poder religioso, político e económico-financeiro imperial que domina a alma/consciência das populações e dos povos. São elas, as mães e os pais deste tipo de mundo que, hoje, por sinal, está aí a desembaraçar-se aceleradamente delas. Infelizmente, não para nos valorizar, populações e povos do mundo, como sujeitos e protagonistas dos nossos próprios destinos e do destino do planeta, mas para nos oprimir e explorar ainda mais, graças aos sofisticadíssimos meios de que dispõe. Não é o cristianismo, enquanto tal, que desaparece. É apenas um tipo de cristianismo religioso, deísta, já com dois mil anos, que desaparece, substituído por outro, totalmente secular, laico, ateu. O facto de ser secular, laico, ateu, não é que aflige. Pelo contrário. O que aflige, e faz este tipo de mundo estar à beira de rebentar pelas costuras, é o facto de se tratar de um secular, laico, ateu idólatra. Pela primeira vez na história, o ateísmo é idólatra. Nega Deus que nunca ninguém viu, e, precisamente porque nunca ninguém O viu, mas para, em seu lugar, adorar o Dinheiro. Obviamente, não lhe chama Deus, mas toda a sua postura perante o Dinheiro é a da idolatria, a mais perversa de todas as idolatrias que já houve à face da terra.

 Tenho dito e não me cansarei de o repetir, até que me escutem: Temos de regressar a Jesus, o de antes do cristianismo, e à sua via política maiêutica. Ou somos capazes deste salto qualitativo em frente (Jesus é o alfa e ómega da humanidade e da criação), e começamos a dar corpo a um tipo de mundo, finalmente, edificado a partir das populações e dos povos, e com as populações e os povos, e temos hoje e amanhã, em que todos os seres humanos, indistintamente, são sujeitos e protagonistas, ou perdemos o hoje e o amanhã humano, sororal. O que restar, é um hoje e um amanhã de terror, de inferno. E, então, melhor será nem sequer chegarmos a nascer.

 Mentem-nos todos os dias, quando numa obscena unanimidade planetária, nos dizem que estamos mergulhados numa crise global. Oxalá fosse uma crise, e global. Haveria motivos para a esperança teológica, entenda-se, plena e integralmente fundada nos seres humanos. A verdade é que estamos mergulhados na mais devastadora guerra mundial financeira e, dificilmente, nos veremos livres dela. O nosso demencial amor ao Dinheiro é tão forte, que dificilmente, nos escutamos, vemos a nós próprias, nós próprios, e escutamos, vemos todos os demais – as populações, os povos do mundo e o planeta.

 Só o ateísmo que o seja também do Deus Dinheiro, nos resgatará das garras deste tipo de mundo, e nasceremos, finalmente, humanos, sororais, maiêuticos, uns para os outros, uns com os outros. Só assim será verdadeiro ateísmo que nega todos os deuses que se alimentam de gente e que, ao tornar-nos relacionais uns com os outros e, maieuticamente religados uns aos outros, mais não é do que uma outra maneira de praticar a Fé teológica, a de Jesus. No mesmo acto de nos tornar relacionais e maieuticamente religados, torna-nos também permanentemente abertos ao Mistério maior que é Deus Abba-Mãe que nunca ninguém viu, porque mais íntimo a nós que nós próprios, e que, ao fazer-nos crescer de dentro para fora, se revela e nos revela. É por aqui que anda o ser humano pleno e integral, Jesus de Nazaré, não, obviamente, o Jesuscristo do cristianismo. E é também por aqui que havemos de andar nós, mulheres, homens, povos do terceiro milénio. Cabe-nos a responsabilidade histórica de sermos, em comunhão com Jesus, a alternativa viva a este tipo de mundo. Sermos, nos nossos próprios corpos, o mundo, finalmente, humano, sororal. Por outras palavras, sermos Jesus, à escala planetária, cósmica. Sem dúvida o Poema mais belo, a obra de arte mais bela. Está nas nossas mãos. Decidamo-nos. Ontem, já era tarde.