20/07/2006

Despertar o sentido crítico

Matosinhos







Joaquim Jorge mentor do Clube dos Pensadores
A sociedade vive cada vez mais de costas voltadas para a política. E, como tal, não se mostra crítica e já não expressa a opinião sobre os problemas que se nos apresentam. O Clube dos Pensadores veio agitar este vazio de ideias em que poderia transformar a nossa sociedade.

Incomodado com a falta de debate que povoa o seio da nossa sociedade, Joaquim Jorge fundou o Clube dos Pensadores. Um local de debate aberto, descomprometido dos partidos políticos e que pretende devolver às pessoas a capacidade de pensar e criticar o que se vai passando.

Matosinhos Hoje (MH): Como surgiu o Clube dos Pensadores?
Joaquim Jorge (JJ): Penso que há um défice de participação. As pessoas têm dificuldade em participar, têm medo de falar... a Democracia tem um problema grande. Democracia quer dizer poder do Povo. No fundo, o poder do Povo está instituído pela parte da ideocracia, que é o poder dos partidos políticos. Eu sou militante de um partido e não sou contra os partidos. Quero é abrir um espaço para as pessoas participarem. E é interessante: as pessoas estão mais soltas, despreocupadas, dizem o que lhes vai na alma. Dizem os “indizíveiz”, o que não é politicamente correcto. E este clube nasce assim: para se pensar. As pessoas não têm tempo para pensar nos dias de hoje. Mete-me confusão o medo, o ter de estar de acordo com o chefe partidário.
MH: Então o balanço destes primeiros encontros é positivo?
JJ: Tem sido fantástico. Mas, uma coisa é certa: não vale a pena termos quinhentas pessoas na audiência se não tivermos a comunicação social presente. Os jornalistas têm-me ajudado muito a passar a mensagem. Apesar do clube não ser um conceito inovador, tenho conseguido divulgá-lo e ter algum protagonismo em vários órgãos de comunicação social. A mensagem tem passado.
MH: E é uma forma dos convidados pensarem desligados desses “compromissos”...
JJ: É uma forma de serem autênticos e espontâneos. É que a mim faz-me confusão o facto de haver um alheamento da realidade. O público, em geral, está fora das questões, não quer saber. Não há massa crítica. Só se critica quando se “toca no bolso”. Por exemplo, este ano estão a ocorrer grandes mudanças e a grande maioria das pessoas não está a par disso.
MH: E isso é preocupante...
JJ: E porque será que tal acontece? Isso a mim preocupa-me. A política tem de estar acima da tecnocracia. Os partidos têm de mudar a forma de ser e estar, têm de se abrir à comunidade para chegar até ela. O País está “anestesiado” e tem de se fazer algo para mudar este estado de coisas.
MH: Daí a pertinência do Clube dos Pensadores...
JJ: Acho que o sucesso deste clube está no facto de não de falar para as pessoas, mas com as pessoas. Cria-se um diálogo entre os convidados e a plateia que acho que é importante.

Dar protagonismo à plateia

MH: Que temas é que têm sido abordados no clube?
JJ: Pessoalmente, gosto de perceber tudo e acho que, socialmente, há uma relação entre política e os jornais. Daí que o primeiro tema fosse a Comunicação Social e os Políticos, com Vicente Jorge Silva. Depois, seguiu-se Luís Filipe Menezes que falou sobre Regionalização e Descentralização. O Poder Local e o seu futuro teve como convidado Narciso Miranda. Finalmente, Manuel Carvalho, do jornal Público, falou sobre Jornalismo, Responsabilidade e Censura.
MH: E o balanço é positivo?
JJ: Muito. Só há um problema neste clube: não leva os participantes a lugares de poder. E explico: o meu poder é não estar à espera de nada. Não estou aqui à procura de qualquer coisa senão levar as pessoas a pensar, debater e participar. Daí que dê o protagonismo aos convidados, resguardando-me um pouco. Protagonismo aos convidados e à plateia. Tudo é possível, com educação e princípios.
MH: Uma abertura que, por vezes, não se vê nos partidos políticos?
JJ: Os partidos têm de se abrir à sociedade civil. Estou cansado dos “velhos elefantes” dos partidos, com grande experiência, envolvidos em mil batalhas e convencidos que o mundo é sempre igual. O mundo não é igual; isto tem evoluído. Temos de mudar. A participação das pessoas é cada vez menor. E isso é culpa delas ou dos partidos?
MH: E é contra a disciplina partidária?
JJ: Não sou contra os partidos. O que sou a favor é da independência nos partidos. Quando uma pessoa tem um pensamento diferente por norma é marginalizado. Não há direito à diferença. E isso é mau. Em vez das qualificações e das provas dadas, vale mais o “seguidismo”, o “lambe-botismo, o bajulamento. Daí que não seja de admirar que, em Portugal, a cidadania se resuma a ir votar de quatro em quatro anos, rodando as elites dos partidos.
MH: O Clube dos Pensadores quer contribuir para mudar este estado de coisas?
JJ: As pessoas que acham que a política é uma coisa suja voltam. Há que influenciar a opinião pública e a governação em seu benefício. Acho que isso era importante.
MH: Finda uma primeira ronda, que debates está a preparar?
JJ: Em Setembro teremos Manuel Alegre para falar de Cidadania e formas de Participação Cívica. Em Outubro teremos Manuel Monteiro com o tema Partidos e o Sistema Político. Paulo Morais, em Novembro, vai abordar a Corrupção. E em Dezembro será a vez de José Leite Pereira e José Marquitos debaterem a Televisão versus Jornais. No meio destes debates ainda estou a tentar trazer António José Seguro para falar de Educação, juntando duas pessoas dos principais sindicatos dos professores e uma presidente do Conselho Executivo de uma escola. Queremos ir ao fundo das questões e dar opiniões que podem ser aplicadas à realidade.
MH: O Clube dos Pensadores pode servir de base de partida para a tomada de posição dos nossos governantes?
JJ: Isso seria ser muito pretensioso...

Matosinhos na linha do debate

MH: Sei que está também a tentar encontrar a melhor data para levar Guilherme Pinto ao Clube dos Pensadores...
JJ: É verdade. Estou a tentar marcar uma data para o debate. Guilherme Pinto esteve, antes de assumir a presidência da Câmara Municipal de Matosinhos, com uma área que me é muito grata: o ambiente. E, analisando o que tem sido até agora o seu mandato, Guilherme Pinto tem imposto a sua maneira de ser, o seu carácter. Estou surpreendido pela positiva. É uma pessoa que já tem grande experiência autárquica e que também contribuiu para tudo o que é Matosinhos. Penso que, com o tempo, ainda vai contribuir ainda mais para o desenvolvimento do concelho.
MH: Já tem ideia qual o tema que gostaria de debater com Guilherme Pinto?
JJ: Ainda não está definido. Será uma coisa a combinar posteriormente.
MH: No entanto, Matosinhos tem uma representante no clube e que faz parte do painel permanente. Como se tem revelado Joana Felício?
JJ: É uma grata surpresa. Tem um bom íntimo, é uma pessoa bem forma no aspecto humano e demostra que tem conhecimentos.
MH: Os primeiros encontros do Clube dos Pensadores têm sido organizados na cidade da Maia. Há perspectivas de levar estes debates a outros locais?
JJ: Gostava de descentralizar os debates. Tenho é de arranjar um espaço que reuna as condições para tal. Matosinhos pode ser uma das próximas cidades escolhidas. Gostaria de trazer as forças vivas da cidade de forma a abrir o debate. Lá para Janeiro: estou a preparar tudo para que seja possível. Tanto que aqui em Matosinhos há muito em que falar. Falar também dos outros concelhos limítrofes. Hoje em dia vivem todos de costas voltadas uns com os outros. Em vez de se trabalhar para o bem comum, há competição. Acho que isso tem de acabar. E é isso que também quero debater no Clube de Pensadores. Por exemplo, políticas de limpeza urbana conjuntas... políticas de transportes públicos comuns.
MH: Há ainda uma novidade no Clube dos Pensadores?
JJ: É verdade. A Invicta TV vai gravar o próximo debate e vai transmiti-lo.
MH: Para além disso, o clube também já aderiu às novas tecnologias...
JJ: O Clube dos Pensadores já tem um blog na internet. Pode ser consultado em http://clubedospensadores.blogspot.com
MH: Como fundador deste clube tem receio de algum tipo de represália pela posição que assume sobre determinados temas?
JJ: A minha maior virtude, que é o maior defeito na política, é pensar pela minha cabeça. Os estatutos do Partido Socialista, ao qual pertenço, dizem que há liberdade crítica para os seus membros. No clube falamos tudo abertamente. Podemos não agradar a todos, mas isso é outra questão.

Joaquim Jorge
48 anos
Natural de S. Mamede de Infesta, Matosinhos
Formado em Biologia pela Faculdade de Ciências do Porto
Foi membro da Comissão Política PS Porto
Membro da Comissão de Honra da candidatura de Manuel Alegre nas Presidenciais
Escreve no jornal O Primeiro de Janeiro
Fundador do Clube dos Pensadores
Por: Laura Vieira